- O que aconteceu: Um Airbus A350-900 da Air France (F-HTYO) voou por cerca de um mês com dano interno no radome, que colapsou em 28/05/2023 após decolagem de Osaka, forçando retorno.
- Por que importa: O dano, provavelmente causado por bird strike anterior, não foi detectado em inspeções; falhas no radar já indicavam delaminação. O caso expõe lacunas de manutenção e treinamento.
- O que muda na prática: Reforço de inspeções em compósitos após impactos, revisão de tarefas de manutenção ligadas a falhas do radar e treinamento da tripulação sobre NAIADS e gestão de air data.
Por Redação EPA
O relatório final do incidente com o Airbus A350-900 da Air France, que decolou de Osaka (Japão) rumo a Paris em 28 de maio de 2023 e retornou após o colapso do radome, conclui que o dano interno já existia há cerca de um mês.
Segundo a investigação, o radome sofreu delaminação interna com alta probabilidade decorrente de impacto com ave anterior. O defeito propagou-se até o colapso, que gerou múltiplas mensagens no ECAM, variação de indicações de velocidade e alertas temporários de Alternate Law.
Três dias antes do incidente, falhas recorrentes do radar meteorológico já apontavam obstrução de movimento da antena. A manutenção realizada não identificou o dano interno, apesar de dimensões relevantes. A investigação cita execução insuficiente de inspeções visuais e/ou inadequação da tarefa prevista para esse tipo de falha.
O NAIADS (novo sistema de troca automática de dados de ar e inerciais) manteve proteções de envelope e automações (AP/FD/ATHR) disponíveis. Contudo, a tripulação, sem conhecimento aprofundado do sistema, optou por desativar os automáticos diante das variações de velocidade.
O que isso muda na prática (piloto, mecânico e aluno)
- Pilotos: diante de anomalias de air data, conhecer a lógica do NAIADS no A350 e manter automações quando confiáveis reduz carga de trabalho; treinar procedimentos de IAS DISAGREE e Alternate Law.
- Mecânicos: após bird strike/raios/granizo/FOD em estruturas compostas, usar métodos que revelem delaminação interna (ex.: inspeção por toque, NDT), não apenas inspeção visual.
- Alunos: entender a relação entre radome, radar e sistemas de ar (pitos/ADIRU); falhas de radar podem sinalizar problemas estruturais que afetam dados de voo.
Análise Técnica EPA: segurança operacional e instrução
Estruturas compostas podem apresentar delaminação interna sem evidência externa clara. Em radomes, a separação de camadas pode bloquear a antena do radar e alterar o fluxo de ar na região do nariz, afetando sensores e gerando mensagens no ECAM.
O caso reforça a importância de tarefas de manutenção que considerem diferenças entre condições de solo e voo. Se a tarefa para falha de radar não garante a detecção do dano interno, é preciso revisá-la e incluir métodos NDT quando aplicável.
Do ponto de vista operacional, o A350 dispõe do NAIADS, que isola fontes de dados de ar/inerciais conflitantes e preserva proteções. Desligar automações por surpresa ou desconhecimento pode elevar a carga de trabalho em uma fase crítica. Programas de EBT (Evidence-Based Training) devem incluir cenários de degradação de air data e gerenciamento de automação.
Referências regulatórias úteis no Brasil: RBAC 121 (operações regulares; define requisitos de treinamento e procedimentos), RBAC 61 (licenças; competências sobre conhecimento de sistemas e limitações) e RBAC 145 (organizações de manutenção; padrões para métodos e qualificação de pessoal). Estes regulamentos orientam políticas internas de operador e oficina para eventos pós-impacto e para atualização de currículos de treinamento.
O que sabemos e o que ainda falta confirmar
- Confirmado: Delaminação interna do radome com alta probabilidade associada a bird strike ocorrido cerca de um mês antes do incidente.
- Confirmado: Falhas no radar meteorológico dias antes indicavam dano interno; inspeções não detectaram o problema.
- Confirmado: O NAIADS manteve proteções e automações disponíveis; a tripulação optou por voar manualmente.
- Em apuração: Ajustes específicos que fabricante e operadores adotarão em tarefas de manutenção e treinamento (documentação e prazos de implementação).
Mini-glossário (1 minuto)
- Radome: Estrutura de material composto que cobre o radar meteorológico no nariz, transparente a ondas de radar.
- NAIADS: Sistema do A350 que faz comutação automática entre fontes de dados de ar e inerciais para manter informações confiáveis.
- ECAM: Sistema de alerta e monitoramento da Airbus que exibe falhas e procedimentos ao piloto.
Fontes consultadas
- BEA – Relatório final do incidente com A350-900 da Air France (em inglês)
- Airbus – Informações técnicas do A350 e sistemas (NAIADS/ECAM)
- EASA – Boas práticas de inspeção em estruturas compostas e bird strike
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